29/07/2019
Por Prof. LOÊDI LISOVSKI,
Advogado de causas criminais e professor.
Premissa fundamental: a suposta confissão do funcionário do GRU resolve o caso?
Não se sabe ao certo se o público de uma maneira geral tem conhecimento de uma máxima que rege a dinâmica no âmbito policial investigativo: a de que custe o que custar, será descoberto um autor do crime. Mas lembre-se que: a função deste órgão é a descoberta do crime e de seu autor.
De forma mais objetiva, o que se quer dizer é que a polícia trabalha com um objetivo muito claro, repita-se: descoberta do crime e sua autoria, que se traduz tecnicamente em descobrir a materialidade do crime e apontar a autoria.
Ocorre que o faz de forma tendenciosa (mais fácil) como o próprio texto legal preceitua, e isto se dá justamente pela finalidade apontada. Repita-se novamente de uma outra forma: é sua atribuição institucional, a partir da Constituição Federal de 1.988 que se encontre o que se acabou de dizer. Logo, a polícia deve realizar o que foi dito. Se justa ou injusta, não é atribuição da polícia dizer(?).
A par da atribuição constitucional mencionada, deve-se se somar a pressão sobre a polícia exercida por: setor público responsável pela segurança (secretaria de segurança pública - chefe), vítimas, mídia, opinião pública, setor de segurança privada (seguradoras, empresas de vigilância, comércio), estatísticas, entre outros a depender do crime.
Pode-se dizer com tranquilidade, que não se exerce tal pressão em todos os crimes, até porque se assim fosse, a polícia já teria desaparecido do cenário público, e fatalmente o Estado já a teria substituído.
Referida pressão ocorre em crimes/fatos de grande repercussão, ou quando alguém com influência é vítima ou exerce sua influência no órgão policial, a exemplo das seguradoras.
Pegue-se como exemplo, vez que de grande repercussão, o roubo do ouro e demais objetos de valor, ocorrido no aeroporto de Guarulhos (terminal de cargas). Até onde se tem notícia, 4 pessoas estão presas (2 funcionários do GRU e 2 outros proprietários do imóvel usado coo base na fuga).
Com base na suposta contradição do depoimento de um funcionário, aquele que teria sido refém dos autores, a polícia paulista chegou a conclusão de que “ele” estaria envolvido, ou seja, a premissa para resolver o caso é a simples contradição de um sujeito que: além de ter sido mantido como refém ao lado de seus familiares por 30 horas, teve de prestar inúmeros depoimentos, refazer todo o trajeto utilizado pelos autores inúmeras vezes, dar esclarecimentos a empresa que trabalha, mídia o perseguindo e divulgando seu nome sem parar, dar justificativas a família, onde se deve somar o fato de que é negro e morador da periferia da grande São Paulo.
Uma pergunta básica: após a contradição, a polícia investigará o que o funcionário disse? Ou apenas seguirá a sua contradição?
Um roubo milionário, histórico, solucionado com base em uma simples contradição? Existe acaso ou a polícia é eficiente? Engraçado que na maioria dos casos, é justamente o acaso que o resolve, e até onde se sabe quando a relação entre dois casos se repete de modo uniforme, o acaso desaparece.Não seria um modus operandi policial usar o acaso?
Perceba-se que o ora acusado, teria “confessado” após se contradizer no interior de uma viatura policial, sem a presença de seu defensor.
Quem atua nessa área sabe que a pressão que sofre a polícia, se transforma em combustível para, literalmente, pressionar um autor a fim de dar conta da solução do caso, ainda que se deixe de lado a questão verdade e Justiça.
Perdeu-se com isso, no caso do roubo, seu referencial técnico/científico a investigação, tendo em vista que toda ela se concentrará, a partir de então, na “confissão” do agora ex-funcionário supostamente envolvido. Mais uma vida que vai.
Por fim, necessário se fazer outra pergunta: caso o ora acusado não queira dar maiores detalhes dos envolvidos no plano, possíveis esconderijos, destino dos valores, etc, o uso de artifícios como ameaçar prender a mulher do mesmo, deixar os filhos sob os cuidados do estado, o uso de ameaças veladas, serão válidos para obtenção da “verdade” ou há neste caso violação aos direitos e garantias fundamentais? Os fins justificam os meios?
Lembre-se: a polícia até então não tem nenhum vestígio dos verdadeiros autores do roubo, nem a materialidade, fato este que, além de aumentar a pressão, é valorado negativamente perante os opressores.
Que me perdoem os agentes de investigação deste fato, mas os verdadeiros autores do crime devem estar dando gargalhadas diante dessa solução tão pífio (pra não dizer medíocre) apresentada.